A Carta Maior prevê a criação de novos partidos políticos, desde que sejam resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo e os direitos fundamentais da pessoa humana. Essas constituem as balizas mestras a que se deve respeito, à priori, apesar do tema ainda precisar ser melhor disposto e regulamentado pelo ordenamento, que neste particular revela-se com lacunas não intencionais, em tese que não deveriam ser desejadas pelo legislador, que se apresenta mais uma vez omisso em seu dever constitucional.Os partidos representam um relevante papel na democracia brasileira, figurando como condição para o exercício do pluripartidarismo. Constituem um dos instrumentais que propiciam à população brasileira a condição de se expressar nos acontecimentos políticos, refletindo a participação social nas decisões do Estado. A finalidade do partido político, em um Estado Democrático, é principalmente organizar as forças em torno de um ideário político para disputar o poder na sociedade, difundindo suas ideologias políticas para conseguir adeptos e tentando contribuir para o direcionamento das políticas públicas. A PLC 14/13 parece haver encontrado séria resistência no órgão de cúpula da função Judiciária (STF), que tem como uma de suas metas promover a efetividade das normas constitucionais e acentuar o processo de constitucionalização das normas de menor hierarquia, que dela não pode afastar-se. O ministro Gilmar Mendes, em caráter liminar, suspendeu a PL mencionada até que o Supremo julgue o mérito após sua aprovação na Câmara dos Deputados e antes da deliberação pelo Senado federal, institucionalmente a Casa revisora que em tese funciona em um processo de abafamento quanto aos arroubos da primeira. Vale lembrar, que nosso sistema constitucional admite o controle prévio dos atos parlamentares, admite o controle político-preventivo, mas não resta dúvidas tratar-se de medida excepcional que só deve ser excepcionada a partir de fundamentos sólidos de "fumus boni iuris" e "periculum in mora" sob pena de se revelar uma intromissão odiosa e inadmitida pelo princípio da separação dos poderes. Há que se deparar com situação de extrema e descarada violação ao Estado Constitucional Democrático de Direito para que o controle político-preventivo não configure excesso de poder. Neste momento o bom-senso albergado no princípio da razoabilidade será sempre um fiel condutor para que não se tangencie o campo da desproporcionalidade. Adotamos dois sistemas de controle de constitucionalidade, a regra, que é jurídico-repressivo, e excepcionalmente, o político-preventivo, e são nestes termos que suspender em caráter de excepcionalidade a tramitação de um projeto de lei antes de sua deliberação pode configurar minimamente uma medida antipática aos olhos do parlamento até mesmo o descompassado excesso de poder jurisdicional, em um exemplo de ativismo político que não se afigura desejado e que pode representar um impedimento a livre iniciativa legislativa. Sem a deliberação do Senado Federal ainda não se pode averiguar o texto como pronto, já que o Senado Federal poderia impelir-lhe alterações substanciais. De acordo com o texto aprovado pela Câmara o parlamentar que trocar de partido durante o mandato não leva para a nova legenda o tempo de televisão e a fatia correspondente de recursos do Fundo Partidário ficando estes recursos no partido que o elegeu. Este ponto há que se entender em fina sintonia com os termos da fidelidade partidária e, portanto fiel a melhor exegese que se deve proceder nos termos inclusive defendidos pelo TSE e pelo Supremo Tribunal Federal. Ao justificar a concessão da liminar, o ministro Gilmar Mendes alegou que a aprovação do projeto causará desequilíbrio no tratamento de legendas: "A aprovação do projeto de lei em exame significará, assim, o tratamento desigual de parlamentares e partidos políticos em uma mesma legislatura. Essa interferência seria ofensiva à lealdade da concorrência democrática, afigurando-se casuística e direcionada a atores políticos específicos". Problema que merece análise é o relativo aos fundos partidários de campanha, que vale dizer, admite doações públicas e privadas. O fundo é composto por verbas que advém de multas e penalidades aplicadas nos termos do Código Eleitoral e leis conexas; de recursos financeiros destinados por lei; de doações de pessoa física ou jurídica; e de dotações orçamentárias da União. Este particular assunto já foi fruto de debate e se revela até hoje polêmico pela utilização de dinheiro público a subvencionar partidos políticos não se fiscalizando suas reais finalidades. A distribuição do fundo partidário segue critérios estabelecidos por lei, no caso a Lei 9.096/95, onde 5% do total do Fundo Partidário serão entregues, em partes iguais, a todos os partidos que tenham seus estatutos registrados no Tribunal Superior Eleitoral, e 95% serão distribuídos na proporção dos votos obtidos na última eleição geral para a Câmara dos Deputados. A Resolução 22.610/2007, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), admite expressamente a desfiliação partidária no caso de criação de novo partido político, mas não prevê como ficaria a distribuição do fundo partidário para um partido recém-criado, que haja percebido a adesão de deputados provenientes de outros partidos. Este novo partido teria direito ao valor proporcional dos votos obtidos por estes deputados na distribuição do fundo? Os votos não pertenceriam ao partido original nos termos principiológicos da fidelidade partidária? A lei 9.096/95 dispõe sobre a distribuição do fundo partidário no caso de fusão e incorporação dos partidos políticos, onde os votos obtidos por eles, na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, devem ser somados, para efeito do funcionamento parlamentar, da distribuição dos recursos e do acesso gratuito ao rádio e à televisão. E quanto a criação de novos partidos? A Lei é omissa. O entendimento que julgo melhor é o que atribui a partidos políticos é a qualidade das agremiações que passaram no teste das urnas. Agremiações que participaram faticamente de eleição popular e, por esta via democrática, tiveram eleitos seus candidatos que lhes servirão como "presentantes" do partido/agremiação e representantes da sociedade no Congresso Nacional de forma concomitante. Trago as palavras do nobre jurisconsulto e poeta Carlos Ayres Brito: "O partido que não participou de nenhuma eleição, não contribuiu para a eleição de nenhum candidato, não constou do esquadro ideológico ou de filosofia política de nenhuma eleição em concreto, não submeteu a nenhum corpo de eleitores seu estatuto ou programa partidário. Ainda não passou pelo teste das urnas, enfim, não ungido na pia batismal do voto". Pergunto: Não atinge diretamente o princípio da isonomia partidária? Se observarmos uma isonomia material acredito que não, já que um novo partido não necessariamente há que se conferir o mesmo tratamento dispensado a uma agremiação que já possui uma história na política nacional. Nesta senda que, em respeito a fidelidade partidária que surgiu em respeito ao eleitor, que tem o direito de escolher o candidato de determinada linha ideológico-partidária para votar e não se ver ludibriado com mudanças repentinas movidas por interesses privatistas no meio da partida, é que entendo que os novos partidos devem fazer construir suas histórias (ônus) para que possam usufruir do que os partidos de história já possuem (bônus). Não entendo que a PL fira o pluripartidarismo já que não impede o surgimento de novas agremiações, tão somente preservando a fidelidade partidária oferta tratamento diferenciado na medida do princípio da isonomia material. Com o mesmo fundamento não tolhe o pleno funcionamento da democracia, apenas impele barreiras para o seu melhor funcionamento. O desequilíbrio entre as legendas em uma mesma legislatura é o ônus a ser enfrentado pelo novo partido. De fato, há que se prever um fundo de participação aos novos partidos mais razoável para que indiretamente não se impeça a sua criação pela impossibilidade de sua manutenção e desta forma comprometa o Estado Democrático de Direito. É neste ponto que a omissão legislativa chama novamente o Judiciário a se pronunciar. Vale, a título de exemplo pensar uma agremiação partidária como uma empresa que cumpre uma fundamental função em nossa democracia. Uma empresa quando nasce terá que vencer a desconfiança e as intempéries do mercado até se tornar uma grande empresa e receber os dividendos proporcionais a sua representatividade no cenário nacional. Neste período a concorrência pode parecer até desleal, mas isso se deu fruto das conquistas das empresas que já obteveram o reconhecimento do mercado, mas que um dia já foram desconhecidas e tiveram que se apresentar ao mercado. Neste passo, por todo o exposto, que entendo haver sido desarrazoada a intervenção do STF via concessão de liminar a fim de suspender o livre andar democrático-constitucional que se estava a se estabelecer, sem que se vislumbre nenhuma grande inconstitucionalidade que impelisse o excepcional controle político-preventivo, já que posteriormente o tema receberia uma analise mais acurada e menos sumária em seu mérito. Um ponto político com repercussão não pode deixar de ser firmemente assentado sem o qual este artigo pecaria pela ausência de completude. O ministro Gilmar Mendes concedeu a liminar levando-se em consideração o entendimento logrado pelo TSE e pelo STF com relação à criação do PSD em 2011, a partir da omissão legislativa a respeito do tema. A justiça concedeu o direito a ter propaganda eleitoral na TV e financiamento público proporcionais à sua bancada na Câmara, a quarta maior, com 48 dos 513 deputados. Esta é sem sombra de dúvidas uma situação que guarda total correspondência com o que tratamos até o presente instante, criando-se nova legenda e importando de outras legendas representantes eleitos, tal qual comentamos, o que julgo equivocado e contrário às linhas principiológicas trazidas com a fidelidade partidária, contrária à isonomia material e ao que o sistema eleitoral legitimamente haveria de esperar, na forma que até o momento reverberei. A PL em comento surge para regulamentar a questão lacunosa logo após o surgimento do PSD, sem conceder os mesmo privilégios aos novos partidos, o que de fato pode revelar-se uma PL com fins políticos casuísticos, já que para a criação do PSD, que seria interessante a maioria da situação e prejudicial à oposição, em especial ao DEM, propiciou-se a igualdade formal e ignorou-se a fidelidade partidária. Agora surge esta PL para dar tratamento oposto ao assentado em 2011 pelo TSE e pelo STF também no interesse da base governista sustentando as linhas da defesa da fidelidade partidária quando se criam agremiações, que nesta oportunidade os novos partidos dividiriam os partidos da base do Governo, que perderiam alguns de seus "presentantes". Foi neste apreciar o sentido da decisão monocrática do Ministro Gilmar Mendes, mas ainda assim entendo exagerada a decisão liminar limitando a plena fruição do Poder Constituído sem uma inconstitucionalidade gritante, apenas indo de encontro as decisão anteriores proferidas no âmbito jurisdicional son o pálio de um preponderante viés político. Após a defesa da fidelidade partidária, na defesa de uma fidelidade intelectual, percebe-se que há sim casuísmo político ínsito a esta PL, mas que só foi oportunizado a partir de decisões judiciais, que entendo equivocadas por parte do TSE e do STF, e neste passo que, a partir de uma necessária ponderação principiológica de interesses em não se percebendo nenhuma inconstitucionalidade aviltante, haver-se-ia de se ver respeitada a livre iniciativa legislativa e pronunciar-se apenas quando da análise meritória, jamais em caráter liminar. Nestes termos que sustento.
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