Em tese o criador “intelectual” do monstro jurídico da PEC
33/11, o Deputado Nazareno Fonteles do PT parece insaciável, e volta a atacar,
agora propondo a PEC 143/ 12.
Há de se considerar sua mais nova obra legiferante como um
monstro aparentemente menos assustador, se tomado como referencial comparativo
a PEC 33/11, mas não devemos julgar pelas aparências, que estão sempre a nos
revelar superficiais e tendentes a enganosidade, ao erro. Para uma cognição
minimamente satisfatória do tema há de se analisar o aspecto meritório da
proposta, sem o que, inviável qualquer juízo de valor definitivo merecedor de
credibilidade.
A Câmara analisa a Proposta de Emenda à Constituição (PEC)
143/12, que altera a forma de escolha dos integrantes do Supremo Tribunal
Federal (STF) e dos tribunais de contas da União (TCU) e dos estados.
A PEC fixa o mandato desses ministros em sete anos, vedada a
recondução e o exercício de novo mandato. A regra passaria a valer para os
nomeados depois que a norma entrar em vigor. Atualmente, como é de conhecimento
comum, a Constituição garante vitaliciedade para os integrantes da magistratura
e dos tribunais de contas.
Pelo texto, os ministros do STF serão escolhidos, de forma
alternada, pelo presidente da República e pelo Congresso Nacional. Atualmente,
a Constituição Federal determina que essa escolha seja feita exclusivamente
pelo chefe do Executivo, com aprovação dos nomes pelo Senado. Pela proposta, a
aprovação pelo Senado continuaria a ocorrer.
A PEC determina que, sempre que a escolha couber ao
Congresso, ela será alternada entre a Câmara e o Senado. Além disso, os
ministros do STF ficariam impedidos de exercer mandato eletivo ou tomar posse
em cargo em comissão na administração pública pelo prazo de até quatro anos
após o término do mandato.
Em relação aos ministros dos tribunais de contas, permanece
a regra atual segundo a qual esses ministros serão escolhidos na seguinte
proporção: um terço pelo Poder Executivo e dois terços pelo Poder Legislativo.
Nos estritos termos da PEC 33/11, a PEC 143/12 propõe a
mesma justificação oficial, o ativismo judicial. Quando discorri em artigo
dedicado a PEC 33/11 delimitei o que seria ativismo judicial no âmbito do
Supremo Tribunal Federal. Reverberei o erro analítico que seria analisa-lo de
forma pejorativa, já que o Judiciário, em especial o STF, apenas o implementa a
partir das omissões e procrastinações das demais funções de poder (Executiva e
Legislativa) nos termos dos mandamentos da Constituição Cidadã de 1988, que
como é consabido adotou um modelo social, prestacional.
Com a PEC 33/11, o nobre deputado Fonteles tornou-se a mais
reluzente celebridade política do momento, repartindo os prestigiosos holofotes
da sociedade com o não menos iluminado Feliciano. Pretende precipuamente aquele,
a partir da PEC 33, retirar o primado constitucional do Judiciário de ter a
última palavra, retirar do Judiciário a força para impor o princípio da
moralidade pública às demais funções de Poder, ignorando as cláusulas pétreas
que são o princípio da separação de poderes e o Estado Democrático de Direito, pretensão
que encontrou uma resposta social avessa às suas elucubrações legislativas.
A PEC 143/12 possui o mesmo fundo intelectivo pouco
apreciável. Se determinar mandato fixo para os ministros do STF não é de todo
equivocado, faz parte de um rodízio democrático já praticado em países como a
Alemanha, Portugal, Espanha, Chile, entre outros, porém o aspecto temporal
diminuto (7 anos) e o formato proposto de indicação revelam-se carcomidos pela
política.
A proposta de não vitaliciedade, de fato poderá promover um
arejamento democrático aos quadros do STF, embora possa comprometer o
inegociável, a independência funcional, já que segundo a proposta após 7 anos o
ministro afastado entrará em um processo de “quarentena” de 4 anos dos serviços
públicos e precisará ter construído uma boa relação política para sua
reinserção, aproveitamento no mercado, promovendo um iminente perigo de deturpação
de suas íntimas convicções pelas vindouras e deletérias influências políticas
ainda quando de seu mandato produzindo entendimentos mais políticos que
propriamente jurídicos.
Some-se a isso o fato de que essa alta rotatividade em
espaços temporais curtos acabará por levar ao STF pessoas com um “notório saber
jurídico” questionável, já que não possuímos em cada esquina um jurisconsulto
com a envergadura para ocupar uma daquelas cadeiras Supremas.
Delimitando-se nos parcos 7 anos de mandato, o rodízio revelar-se-á
exacerbado e não se conseguirá construir maiorias plenárias com uma mínima
solidez temporal, o que fará gerar um processo delicado de insegurança jurídica
desfavorável às relações sociais. Uma temática pacificada hoje com determinada
composição plenária poderá ser severamente modificada a partir de um pleno sistematicamente
alterado, comprometendo a paz social de relações já acomodadas no seio
jurídico-social. As respostas jurídico-sociais não podem sofrer dissonantes
perturbações de sentido em períodos de tempo tão exíguos. Talvez o prazo de 15
anos revelar-se-ia uma proposta mais fidedigna de apreciação.
O ponto que merece críticas mais severas com maior
eloquência extrai-se da forma de indicação. Hoje o Chefe do Executivo é
pessoalmente responsabilizado por suas escolhas a depender da leitura que a
sociedade fizer, se uma escolha nos termos da Constituição a partir de uma “notório
saber jurídico” e reputação ilibada ou se por simples razões políticas, o que
deveria, em tese, promover um freio no ímpeto de se aparelhar ideologicamente o
Supremo, o que não tem ocorrido, diga-se de passagem. De fato, não é isso que
vem se sucedendo quando temos visto nomeações por critérios estritamente
político-partidários, lamentavelmente.
Ocorre que, a proposta nos termos da PEC em comento
representará irrefutavelmente a morte de um Supremo Tribunal Federal
independente, que utiliza das razões de direito, inclusive para desinfetar as
razões da política e promover a paz social a partir de suas decisões. A
inserção política do Congresso Nacional que se somará alternadamente a já
política Presidência da Republica promoverá uma irremediável politização da
justiça e o fim do processo de moralização da política recém iniciado pelo
Supremo Tribunal Federal.
O Legislativo, em particular o Congresso Nacional, revela-se
a função de poder mais irresponsável da estrutura tripartite traçada por
Montesquieu. Além de contar com as inúmeras imunidades por “prerrogativas de
função”, seus membros podem se esconder por detrás de deliberações
majoritárias, em tese legítimas, já que a sociedade, com o voto, lhes concedeu
uma procuração para atuar com totais poderes, sem restrições, inclusive sem a
necessidade de observância do que se revela razoável até mesmo para o senso
comum , a razoabilidade que é justamente o sindicado pelo Judiciário e que buscam
através de PECs constitucionalizar a inoperância dos poderes de sindicabilidade do Supremo e do Ministério
Público, verdadeiros calos das práticas imorais a serem neutralizados.
É mais que claro que um STF escolhido pela Presidência, e de
acordo com a proposta, alternativamente, pelo CN, fomenta um STF subordinado as
razões de ordem política. É mais que notória a tentativa de se modificar
implicitamente o texto constitucional como forma de burlar a cláusula pétrea
que constitui o Estado Democrático de Direito implementando-se faticamente um “Estado
Político Constitucionalizado”, e para isso o Congresso de mãos dadas com o
Executivo utiliza das PECs como instrumento.
Neste continuar teremos um Estado Democrático de Direito
apenas escrito no papel, quando de fato viveremos uma Constituição
ideológico-partidária atendendo aos interesses políticos da situação.
A sindicabilidade que o Direito passou a implementar nas
razões políticas desviadas do interesse público pondo em cheque a clausula
implícita que vigia de impunidade dos membros de poder passou a se revelar um
entrave a ser eliminado. É em verdade, uma ação que procura promover a fluidez
do mais probo senso de ética do STF a fim de se harmonizar com as negociáveis
éticas das demais funções políticas de poder.
Impublicáveis são as possibilidades que se abririam de
negociações para o CN implementar a escolha de um nome para a sucessão no STF,
que cumpriria o restrito mandato de 7 anos necessariamente mais comprometido
com as causas políticas e menos com o Direito. Por certo, calando-se o MP com a
PEC 37, apagando-se as luzes do Judiciário com as PECs 33 e 143, nunca mais
veremos um político da situação nem denunciado nem muito menos condenado, ou lato senso, uma causa de interesse
político- governista rejeitada. Uma legítima e constitucionalizada democracia
unipartidária, que feriria implicitamente o democrático pluripartidarismo
(clausula pétrea) com todos os instrumentos para democratizar o formato
absolutista de governar pela perpetuação no poder, sem que possam ser
sindicáveis seus métodos pouco ortodoxos contrários ao interesse público e ao
Estado Democrático de Direito, que a esta altura já vivenciaríamos o “Estado Político
Constitucionalizado” referido.
O STF vale dizer, ao contrário do que muitos imaginam
entender, é uma instituição contramajoritaria na defesa precípua do interesse
das minorias. A escolha de seus membros não precisa seguir critérios políticos
de determinada ideologia partidária majoritária para ser democrática, senão aos
critérios traçados pelo constituinte originário, precipuamente os de “notório
saber jurídico” e reputação ilibada, o primeiro com certa carga de subjetivismo
conforme se viu em algumas das últimas nomeações e em nomes ventilados para as
vindouras sucessões.
A escolha, ao contrário, deveria ser de precípua
responsabilidade do Judiciário, única função capaz de avaliar com alguma
precisão o critério “notório saber jurídico” com alguma excelência lógica,
ainda que posteriormente passasse por uma sabatina congressual como forma de se
praticar a teoria dos “checks in balances”.
Ao legislativo seria dada a oportunidade de rejeitar mediante alguns dos
fundamentos que seriam taxativamente elencados, concedendo-se prazo para o STF
dizer (pronunciar-se) sobre a rejeição. Não acolhida a rejeição valeria a
escolha perpetrada pelo Judiciário, já que trata-se de membro escolhido para a
função judicante e não para uma função política.
A luta para a sociedade hoje deve estar focada para
manutenção de um Judiciário independente, decidindo segundo os termos do melhor
direito. As razões de ordem política se não desconsideradas ao menos sempre
subordinadas às de Direito no momento de decidir, sendo certo que o ordenamento
que servirá como fundamento das decisões no âmbito da justiça passou pelo crivo
de uma estrutura democrática de aprovação nos estritos termos da CRFB, e já
recebeu a legitimação democrática da sociedade e sua carga político-valorativa quando
de sua formação, que em regra conta com a participação do Executivo e sempre
com a do CN (no caso de lei federal).
Hoje a maior ameaça ao melhor funcionamento das instituições
e da própria sociedade tornou-se o “ativismo político” na justiça. Se estas
PECs de cunho político forem aprovadas as razões de Direito restarem
subordinadas aos interesses políticos e passaremos a viver em um Estado
despótico político sob o pálio de uma criada “constitucionalidade” voltada
perpetuação da impunidade.
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