Em apertada síntese, de acordo com a proposta que passou pela comissão sem sequer ser debatida, a CCJ da Câmara aprovou nesta quarta-feira, 24, a admissibilidade da PEC 33/11, do deputado Nazareno Fonteles, que prevê a alteração da quantidade mínima de votos de membros de tribunais para declaração de inconstitucionalidade de leis; condiciona o efeito vinculante de súmulas aprovadas pelo STF à aprovação pelo Poder Legislativo e submete ao Congresso Nacional a decisão sobre a inconstitucionalidade de Emendas Constitucionais.
De acordo com a PEC, a aprovação de 9 dos 11 ministros, quatro quintos, do STF será necessária para a publicação de súmula, que deverá ser remetida ao Congresso Nacional para aprovação, por maioria absoluta de seu efeito vinculante, em até 90 dias. Caso a decisão não seja feita no prazo, a súmula terá efeitos vinculantes. A proposta enfatiza que a súmula deve se basear somente nas decisões precedentes, sem extrapolar para outras possíveis situações.
Em sentido parecido, a proposta se refere às ADIs e às ADCs, sendo que, para que produzam efeito vinculante e eficácia erga omnes, deverão ser apreciadas pelo Congresso Nacional, o qual deverá se manifestar em sessão conjunta, por três quintos de seus membros, no prazo de 90 dias ao fim do qual, se não concluída a votação, prevalecerá a decisão do STF.
Bem, insipiente seria analisar a tematizada PEC sem esclarecer seus criteriosos contornos que promovem a sua justificação. Em verdade, toda PEC possui uma justificação oficial, que por vezes guarda similaridade com sua justificação oficiosa, a justificação "à vera".
Desta PEC, entrementes, deve-se por honestidade intelectiva sublimar a justificação oficial por seu mais completo descompasso com a realidade posta dos fatos, o que passo a demonstrar.
Apenas a título de informação, a justificação oficial se atém a questão do ativismo judicial, que até por momentos existe de fato, mas sempre pautado no interesse público primário maior, a partir de uma anterior provocação que, de regra, possui sua ratio essendi na omissão de alguma instituição ou função de poder, o que, de sorte, o faz legítimo e consentâneo com o modelo de Estado prestacional ao qual nossa Constituição Republicana de 1988 aderiu.
O judiciário está vocacionado nos temos constitucionais a resolução de conflitos de interesses podendo agir em caráter preventivo (ideal) ou repressivo, na busca da paz social. Quando há uma demanda social de caráter emergencial onde se denota em grau exorbitante a omissão de qualquer das funções ou instituições de poder, e o Judiciário é instado a atuar, a sair de seu estado de inércia jurisdicional, este não pode deixar de se manifestar concedendo ou negando o reclamo de interesse público ou atuando como órgão que impelirá a função ou instituição omissa a sair de seu estado de sono profundo e agir segundo as necessidades sociais ou políticas de interesse público. Desta sorte, não há que se falar em ativismo judicial de forma pejorativa se seu aspecto cognitivo é de interesse público primário e seu fundamento encontra espeque na omissão de outra função ou instituição de poder a partir de uma demanda social premente. O Judiciário, e mais especificamente o STF, neste agir, não usurpa função, mas cumpre a sua de conceder efetividade aos termos da Constituição, que tem por função institucional sua guarda.
Passado este introito explicativo necessário passemos as justificativas oficiosas, vislumbremos as razões que de fato impulsionam a PEC 33/01. Em verdade, as razões, ou melhor, a razão da PEC 33 guarda a mesma racionalidade que fez nascer a PEC 37, ambas em suas justificações oficiosas promanam respostas na modalidade retaliação. Uma força tarefa de raiz, tronco e membros política, que busca esvaziar as instituições que denuncia (PEC 37) e condena (PEC 33) os crimes de poder onde a impunidade, até a Ação Penal 470, constituía a regra.
Das patentes inconstitucionalidades atinentes a PEC 37 eu já tratei exaustivamente em artigo que foi publicado, inclusive, em sites oficiais ligados ao MP. Desta me abstenho de maiores considerações, mas aconselho aos interessados a leitura do artigo que caracterizo a PEC 37 como um "golpe na democracia".
No tocante a PEC 33 não há muito a comentar que vá além do debate político que julgo intelectualmente vulgar e desinteressante, mas dele não posso eximir-me, porém postergo-o para a conclusão do presente.
Antes, juridicamente observada a PEC 33, esta denota-se de forma nada sutil, à contrário senso, grosseira, de uma inconstitucionalidade latente. Fere de morte o princípio da separação dos poderes, da harmonia entre as funções de poder, que encontra-se em nosso Diploma Maior disposto como clausula pétrea. Vislumbra-se uma acachapante usurpação de função do STF que se soma a tentativa de torná-lo uma função de poder estruturalmente inoperante, como buscam com a PEC 37 em relação ao MP. No tocante a PEC 33, subjugando o Supremo Tribunal Federal ao Congresso Nacional, em estrondoso descompasso com os termos de nossa Constituição tomada a partir de uma interpretação sistemática.
Quando se procura alterar a parte essencial de um clausula pétrea, seu núcleo duro, reverbera-se prima-facie sua inconstitucionalidade, pois neste segmento a tentativa de alteração transborda as possibilidades materialmente viáveis. Neste enquadramento de essencialidade das clausulas pétreas forma-se a viga mestra de toda ordem constitucional, e por isso, o constituinte originário as protegeu das argúcias viscerais de um golpe casuístico que promova ou deturpe o primado do Estado Democrático de Direito em nome de um poder marcado pela temporariedade.
É inadmissível que as funções legislativa ou executiva tenham o poder de caçar uma decisão do Supremo Tribunal Federal ou confirmar constitucionalidades declaradas inconstitucionais pelo STF, nos termos da Constituição Polaca de 37, quando o executivo possuía esta força. Aquela época vivenciávamos um período de ditadura, onde o governo centralizado detinha superpoderes insindicáveis com todas as funções de interesse previamente avocadas por imposição.
Faz-se de contornos claros a percepção que a ação penal 470, o julgamento do mensalão, está sendo a mola propulsora deste processo de tentativa de desdemocratização. Busca-se nas mais diversas frentes aniquilar uma força de mudança que nasceu, onde as funções de poder são harmônicas e independentes, mas são também sindicáveis por suas mazelas através da política dos freios e contrapesos, onde se passou a não mais admitir-se o conluio de poder.
Nosso sistema constitucional proclama o primado do Judiciário, é ele que possui a última palavra nos termos da repartição de funções taxativamente determinada pelo constituinte originário da Constituição Cidadã de 1988. Nestes termos que formamos um Estado Democrático de Direito, e não um Estado Político, não tendo sido conferida a última palavra a qualquer outra função de poder, que não a judiciária, que se mostra a única com aptidão final para retirar do mundo ilegalidades e inconstitucionalidades que lesem ou ameacem direitos protegidos pelo ordenamento pátrio. Nestes termos a última palavra pertence à higidez devidamente fundamentada do Direito e não as razões venais e traficadas que a política traz em seu seio.
Esta nova tentativa de golpe contra a democracia pautada na justiça não pode prosperar a partir de um poder transitório que busca se perpetuar. Não se pode admitir que um legislativo comprado para atuar na linha do executivo, conforme demonstrado na Ação Penal 470, possa anular a função de sindicar do judiciário por ter agido nos termos de uma desejada equidade jurídica, mas em descompasso dos interesses de impunidade de determinado poder político representado por seus membros de poder.
A PEC 33 encontrava-se em compasso de espera, no aguardo do resultado do julgamento do mensalão, nascida pós-escândalo, fruto do temor de que a política na Ação Penal 470 não conseguisse majoritariamente vestir toga. Pois bem, esta estrambólica criação está aí. URGE A IMPETRAÇÃO DE MS CONTRA ESSE ATENTADO!
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