Corrupção significa quebrado em
pedaços e em uma segunda acepção apodrecido, pútrido.
“Quando o poder conduz o homem para
arrogância, a poesia lembra-o de suas limitações. Quando o poder estreita as
áreas de interesse do homem, a poesia lembra-o da riqueza e da diversidade de
sua existência. Quando o poder corrompe a poesia limpa”, (por John F. Kennedy –
26/10/63).
“Quando os homens são puros as
leis são desnecessárias, quando são corruptos as leis são inúteis”, (por
Benjamin Diereali – 1881).
“O surgimento das sociedades
organizadas corromperam o homem levando-o para um estado de barbárie”, (por
Jean Jacques Russeau).
De fato precisaríamos de uma reforma
profunda a começar por nossa atual Constituição Republicana, que não pode ficar
restrita ao espírito, mas sim se corporificar por normas. Seus valores devem se
normatizados para se alcançar uma maior efetividade em seu poder de
imperatividade, de coerção.
Feita ainda sobre os ares
sombrios de uma ditadura que ainda cafungava no cangote concedeu-se uma autonomia
e uma proteção excessivas a algumas funções de poder que se tornaram cínicas,
imorais e prepotentes por essência.
Perfez-se um diploma extremamente
inchado, que trata em um sem número de momentos de assuntos sem qualquer viés
constitucional, apenas formalmente constitucional por lá se incluir, mas
notadamente infraconstitucional em seu aspecto material, criando-se um diploma
menos focado do que de deveria para as questões imperativas de Estado.
O art. 37 da CF, que sofreu
inúmeras alterações com a EC 19/98 sim, deveria orientar todos os demais
artigos constitucionais quando se referisse a atuações de qualquer de funções
de poder, não apenas principiologicamente como faz para uma melhor exegese das
regras constitucionais, mas sim revestido como fator a preponderar no momento
da própria criação e alteração destas.
Quero dizer, que os princípios da
legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da publicidade e da eficiência
devem perder suas ínsitas cargas de abstração e ganhar concretude direta e
imediata em cada dispositivo do ordenamento. Dever-se-ia dispensar o judiciário
de ter que pronunciar-se pela aplicação de dados princípios quando violados,
encontrando-os já inseridos em cada dispositivo da Carta Maior e
consequentemente na Legislação infra.
Sua violação representaria a
violação direta de alguma norma constitucional e de seus corolários legais, em
um sistema que se integraria, que se apresentasse sem lacunas propiciadoras dos
desvios funcionais e de interesses, um verdadeiro câncer organizado de poder.
Os princípios orientadores da
Administração deveriam estar postos como cláusulas pétreas com o fito apenas de
se subsumir a novas situações ainda não previstas pelo direito positivo que se
fizesse apresentar, já que este jamais acompanhará a evolução dos
acontecimentos sociais de relevo para o direito.
A excessiva liberdade de atuação
conferida às funções executiva e legislativa, a partir de um ordenamento frouxo
e complacente, repleto de imunidades materiais e processuais dirigidas aos
agentes desviados do interesse público, foi o grande incentivador para
disseminação dos crimes contra a Administração Pública, que em verdade, melhor estariam
caracterizados como crimes contra a sociedade, pois é o erário público que se
sangra sob a batuta de interesses privatistas de poder.
Crimes contra a Administração
Pública deveriam contar com o máximo rigor das normas penais, ter o mesmo
tratamento conferido aos crimes hediondos e serem imprescritíveis, para que não
se permitisse o funcionamento do sistema de conluio instalado entre as funções
de poder perpetradores da desordem moral, a fim de que não logre êxito a impunidade
por razões de ordem temporal ou de favorecimentos escambiados de ordem política.
As penas aplicadas aos os tipos penais violadores do interesse público
perpetrados por mandatários, agentes públicos e políticos deveriam ganhar
caráter de exemplaridade, a fim de se açoitar os aventureiros que contam com as
facilidades da máquina estatal.
Democracia não deve trazer como
consequência a impunidade pelo excesso de liberdade. As funções públicas devem
ser exercidas através de uma liberdade controlada, vigiada. O poder
fiscalizatório deve ser o poder máximo do Estado e seus exercentes não podem
ser nomeados politicamente, mas concursados, treinados e aptos ao exercício retilíneo
e probo. Deveriam fiscalizar e serem fiscalizados por suas fiscalizações, a
política abandonada e a eficiência normativa incorporada.
Bradam-se verdadeiras falácias
como forma de se fundamentar a burla as exigências legais e se desviar dos fins
de direito. A licitação, um exemplo, em tese, que o ordenamento possui para se
aplicar os princípios da legalidade, da moralidade, da impessoalidade e da
publicidade, se mostra reiteradamente ineficiente ao seu fim maior. Cartas
marcadas, objetos licitados superfaturados formam a tônica de um sistema
aviltante ao art. 37 da CRFB. Legalizam-se procedimentos licitatórios
simplificados onde a fiscalização da legalidade se faz insipiente e renegada,
alega-se a busca da celeridade como uma exigência do mercado, quando a
morosidade mostra-se como retrato da mais absoluta ineficiência administrativa.
Criam-se situações artificiais de emergência que possam levar a alguma das
hipóteses de dispensa de licitação com o objetivo de se firmarem contratações
diretas, superfaturadas e atentadoras dos princípios e artigo que se deveria
paradigmar.
Uma porcentagem mínima dos
desvios de finalidade é tornada pública, já que ardilosamente protegidas pelo
sistema organizado de poder. Desta, uma porcentagem ínfima resta apurada e
levada ao judiciário, que quando não se depara com a prescrições ou
arquivamento políticos, possuem a disposição a complacência de um ordenamento
incapaz de proporcionar uma reprimenda suficiente, que se mostre proporcional
ao dano vislumbrado. Dano, que não se mede apenas por valores pecuniários, mas
sim, ainda, pelos valores morais de uma higidez de probidade que se deveria
esperar dos que ocupam qualquer função pública e que deveriam atuar segundo a
supremacia do interesse público.
A guerra contra esse estado
insustentável de decadência moral deveria estar declarada. Barreiras advindas
do déficit educacional e moral da própria sociedade, que se somatiza a omissão
de uma efetiva participação direta desta em seus próprios destinos, ainda
preponderam, e de certa forma, legitimam as escaras do sistema. Distorções como
a simpatia vilmente comprada da sociedade através de uma política populista em
sua feição apodrecida, garantem que o sistema se mantenha higidamente putrefato
e com as mesmas figuras repugnantes no comando.
O poder emana do povo que o
exerce, em regra, indiretamente por sua representes. Lindo, porém em nossa
democracia, de diminuta aplicabilidade prática, já que somos incapazes de
escolher o menos venal entre os venais, salvo pontuais exceções, e destes
escolhidos não temos qualquer forma de controle eficiente de suas gestões e
mandatos, que fica basicamente restrito ao sufrágio de uma maioria de
analfabetos funcionais com dificuldades até mesmo de autodeterminarem-se. Em
verdade, o poder é exercido pelo poder e no interesse do poder.
Uma democracia construída para
proteção das liberdades de poder, sem controle eficiente da sociedade, que em
grande parte nem ao menos conhece os instrumentos que lhe estão postos, que
entende que democracia se resume ao voto e a liberdade de expressão. Uma
democracia já carcumida, embora ainda pós-embrionária, que se depara com o apodrecimento
antes mesmo de alcançar sua maturidade.
Uma Constituição mais enxuta, com
uma federação menos centralizada em um de seus entes “autônomos”, a União, que
confira autonomias “cum granus salis”, pois o poder fiscalizatório deve ser o
poder de prevalência entre os demais. Uma federação onde o Executivo, o
legislativo e o judiciário, amplamente fiscalizados, encontrem uma paridade de
forças até o momento de se acionar o judiciário, quando este terá sempre a
última palavra como deve ser em um Estado Democrático de Direito. Uma
Constituição onde o legislativo não possa votar matérias de interesse pessoal
de seus membros, ou em caso de permissivo constitucional, que reste ratificado
pelas demais funções de poder para que a imoralidade encontre barreiras para
perseverar.
Lembremos que nossa ordem maior
consagrou um Estado democrático de Direito, e não um Estado Político
Democrático como faz transparecer. As razões políticas só estão legitimadas se enquadradas
no campo da legalidade (lato sensu), caso contrário as razões deverão ser
sumariamente repelidas e emblematicamente punidas.
Enfim, mudanças tantas que não é
o local e nem o objetivo deste artigo trazê-las pontualmente, que talvez a
CF/88 mostre-se “irremendável” e deva ser construída uma nova ordem
constitucional, agora a partir de uma base democrática mais experimentada e com
boa parte de seus vícios passíveis de serem visualizados e eliminados, uma
democracia com suas duas pernas para caminhar com menos desvios e
desequilíbrios.
O poder não fiscalizado é um
poder irremediavelmente corrompido. A fiscalização e a transparência em graus
superlativos são imperativos de uma democracia praticável, onde as liberdades
prestam contas a sociedade e a quem de direito.
Talvez a mais completa ausência
de vontade política em uma sociedade intelectualmente pobre e pouco discernida,
sejam as pedras que esta “democracia democrática” a ser construída precise
enfrentar para que venha a lume... Hoje uma utopia, amanhã a história nos
contará de sua viabilidade...
Um Estado corrupto é um Estado
apodrecido.
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