14 agosto, 2008

QUEM SERIAM OS DESTINATÁRIOS DESTA SÚMULA VINCULANTE???

O Plenário do Supremo Tribunal Federal aprovou, nessa quarta-feira (13), a 11ª Súmula Vinculante, consolidando jurisprudência da Corte no sentido de que o uso de algemas somente é lícito em casos excepcionais e prevendo a aplicação de penalidades pelo abuso nesta forma de constrangimento físico e moral do preso. Será? Será que referida súmula contará com o atributo da generalidade ou foi mais uma "decisão" pró-elite? O Tribunal decidiu, também, dar a esta e às demais Súmulas Vinculantes um caráter impeditivo de recursos, ou seja, das decisões tomadas com base nesse entendimento do STF não caberá recurso.
É a seguinte a íntegra do texto aprovado:
“Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado”. Nulidade da prisão, como assim?
Em uma interpretação literal do texto supra, não resta dúvida tratar-se de um texto virtuoso, porém... iremos a frente...
A decisão de editar a súmula foi tomada pela Corte no último dia 7, durante o julgamento do Habeas Corpus (HC) 91952. Na ocasião, o Plenário anulou a condenação do pedreiro Antônio Sérgio da Silva pelo Tribunal do Júri de Laranjal Paulista (SP), pelo fato de ter ele sido mantido algemado durante todo o seu julgamento, sem que a juíza-presidente daquele tribunal apresentasse uma justificativa convincente para o caso.
No mesmo julgamento, a Corte decidiu, também, deixar mais explicitado o seu entendimento sobre o uso generalizado de algemas, diante do que considerou uso abusivo, nos últimos tempos, em que pessoas detidas vêm sendo expostas, algemadas, aos flashes arguciosos das mais diversas lentes provenientes da mídia... Pesssoas... iremos a frente...
A súmula consolida entendimento do STF sobre o cumprimento de legislação que já trata do assunto. É o caso, entre outros, do inciso III do artigo 1º da Constituição Federal (CF); de vários incisos do artigo 5º da (CF), que dispõem sobre o respeito à dignidade da pessoa humana e os seus direitos fundamentais, bem como dos artigos 284 e 292 do Código de Processo Penal (CPP) que tratam do uso restrito da força quando da realização da prisão de uma pessoa.
Além disso, o artigo 474 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei 11.689/08, dispõe, em seu parágrafo 3º: “Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do Júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes”. Provém deste artigo a precípua fundamentação, que trouxe a anulação da condenação advinda do Tribunal do Juri do proletário acima mencionado, fruto de uma norma que inadmite maiores interpretações...
Convidado a se manifestar sobre o texto da súmula, o procurador-geral da República, Antônio Fernando Souza salientou, que o controle externo da autoridade policial é atribuição do Ministério Público, função esta, segundo ele, ainda não devidamente compreendida pela sociedade.
Ele manifestou a sua preocupação com o efeito prático da súmula sobre a autoridade policial, no ato da prisão, ou seja, que a súmula possa vir a servir como elemento desestabilizador do trabalho da polícia. O procurador-geral lembrou que, muitas vezes, um agente policial tem de prender, sozinho, um criminoso, correndo risco. Lembrou, também, que é interesse do Estado conter a criminalidade e disse que, para isso, é necessário utilizar a força, quando necessário.
O ministro Cezar Peluso reconheceu que o ato de prender um criminoso e de conduzir um preso é sempre perigoso. Por isso, segundo ele, “a interpretação deve ser sempre em favor do agente do Estado ou da autoridade”. O primeiro fundamento de minha preocupação...
Por seu turno, o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, disse que a súmula tinha basicamente o objetivo de evitar o uso de algemas para exposição pública do preso. “A Corte jamais validou esta prática, que viola a presunção da inocência e o princípio da dignidade humana”, afirmou. Segundo ele, em geral, a utilização de algemas já é feita com o propósito de violar claramente esses princípios. O objetivo é "algemar e colocar na TV", afirmou. "Ao Ministério Público incumbe zelar também pelos direitos humanos, inclusive propondo os inquéritos devidos", concluiu. Eis aqui o segundo fundamento de minha preocupação...
Como havia comentado acima, tomada a súmula em sua interpretação simplista e literal seria indubitavelmente de exegese virtuosa. A problemática surge quando se busca uma interpretação teleológica... A partir deste instante, percebe-se que a ratio normativa não alcança a população como um todo, mas sim privilegia uma diminuta elite bem patrocinada... Quando o ministro Cesar Peluso reconhece, que há sempre um perigo iminente ao se deter um suspeito e Gilmar Mendes afirma, que a súmula buscava evitar o uso de algemas para a exposição pública dos presos, fica implícito que a preocupação da mais alta corte constitucional, mais uma vez amesquinha-se à elite criminosa, pois não são essas prisões que recebem cobertura da mídia ou estaria eu enganado? Praticantes das artes de lavar dinheiro, apropriar-se indevidamente, entre tantas outras figuras do crimes de colarinho branco, todos com o dinheiro público, é claro...
Para o cidadão comum, entre eles os furtadores de margarina, se fará pertinente a observação "pelusiana", para a elite, que se auto-remunera indevidamente, utilizar-se-á a razão de ser normativa "mendiana"...
Para o cidadão comum o desconhecimento de sua provável violência cumulada ao risco de fulga servirá para a autoridade fundamentar suas algemas, para os nobres furtadores renomados e muito bem representados judicial e extrajudicialmente, o excesso, a ofensa à dignidade da pessoa humana serão suscitadas, haja vista a impossibilidade de violência ou fuga por ocasião de suas prisões que recebem a cobertura de toda a imprensa tupiniquim, daí o que convencionaram chamar de prisão show, ou estaria eu enganado...
O princípio da igualdade insculpido no art. 5º da CR, onde "todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza", talvez se faça presente, quando e somente quando, o furtador de margarina receber os holofote da imprensa e se e somente se tratar-se de um cadeirante...
Já o "crime de elite", encontra-se a partir desta súmula com mais uma proteção, agora de nosso tribunal maior, o político, que nada mais fez do que proteger os seus, tratando igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, em uma leitura mais moderna do princípio da isonomia apenas utilizada em um momento inapropriado, para o povo e conveniente para a elite, ou estaria eu enganado?
Para findar, deixo consignado meu espanto quanto a parte mais "gaga" da súmula em comento. Se houver o uso de algemas, e por isso a prisão for entendida como "ofensiva a dignidade humana", será ela considerada nula, segundo o texto. Ou seja, será tida como ilegal e por isso promover-se-á a soltura do preso? Se assim for, a situação muda completamente de figura, passando a ser interessante para os advogados que venham a patrocinar a causa de seus clientes, que venham as autoridades a utilizar de algemas, abrindo mais uma possibilidade para seu cliente voltar a liberdade e jogar por terra toda a investigação que porventura haja sido feita...
Conclui-se portanto, que o que seria virtuoso em uma vestibular análise, pode revelar-se mais um lamentável absurdo jurídico perpetrado pelos velhinhos do poder, ainda que nem todos sejam tão velhinhos assim...

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